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Semana Santa 2016


Eis o homem!

Frei Raniero Cantalamessa ofmcap

Acabamos de ouvir o relato do julgamento de Jesus perante Pilatos. Há nele um momento que nos pede uma atenção especial.

“Pilatos mandou então flagelar Jesus. Os soldados teceram de espinhos uma coroa, puseram-na sobre a sua cabeça e o cobriram com um manto de púrpura. Aproximavam-se dele e diziam: Salve, rei dos judeus! E davam-lhe bofetadas. Pilatos saiu outra vez e disse-lhes: Eis que vo-lo trago fora, para que saibais que não acho nele nenhum motivo de acusação. Apareceu então Jesus, trazendo a coroa de espinhos e o manto de púrpura. Pilatos disse: Ecce homo! Eis o homem!” (Jo 19,1-5).

Entre as muitas pinturas que retratam o Ecce Homo, há uma que sempre me impressionou. É de Jan Mostaert, pintor flamengo do século XVI, e está na National Gallery de Londres. Tentarei descrevê-la. Ela nos ajudará a imprimir melhor na mente o episódio, já que o pintor transcreve fielmente, em cores, os dados do relato evangélico, especialmente do relato de Marcos (Mc 15,16-20).

Jesus tem na cabeça uma coroa de espinhos. Um feixe de arbustos espinhosos que estava no pátio, talvez para fazer fogo, deu aos soldados a ideia dessa cruel zombaria da sua realeza. Da cabeça de Jesus descem gotas de sangue. Sua boca está semiaberta, como que lutando para respirar. Sobre os ombros, sulcados pelos golpes recentes da flagelação, um manto pesado e desgastado, mais próximo da lata que da estopa. Ele tem os pulsos amarrados por uma corda grosseira; em uma das mãos, eles colocaram um pedaço de pau a fazer as vezes de cetro e, na outra, um feixe de varetas, símbolos que ridicularizavam a sua majestade. Jesus não pode mover sequer um dedo; é o homem reduzido à total impotência, o protótipo de todos os algemados da história.

Meditando sobre a Paixão, o filósofo Blaise Pascal escreveu certa vez estas palavras: "Cristo está em agonia até o fim do mundo: não podemos dormir durante este tempo"vi. Num sentido estas palavras se aplicam à pessoa de Jesus mesmo, ou seja, à cabeça do corpo místico e não apenas aos membros. Não apesar de Ele ter ressuscitado e estar vivo, mas justamente porque Ele ressuscitou e está vivo. Deixemos de lado, no entanto, este significado misterioso demais para nós e falemos do sentido mais claro daquelas palavras. Jesus está em agonia até o fim do mundo em cada homem ou mulher submetidos aos mesmos tormentos. "Vós o fizestes a mim" (Mt 25,40): Ele não disse esta frase apenas sobre quem acredita nele; ele a disse sobre cada homem e cada mulher famintos, nus, maltratados, presos.

Ao menos por uma vez, não pensemos nos males sociais, coletivos: a fome, a pobreza, a injustiça, a exploração dos fracos. Desses males já se fala muitas vezes, embora nunca o suficiente, e há o risco de se tornarem abstrações. Categorias, não pessoas. Pensemos agora no sofrimento dos indivíduos, das pessoas com nome e identidade concreta; nas torturas decididas a sangue frio e infligidas voluntariamente, neste exato momento, por seres humanos contra outros seres humanos, inclusive crianças.

Quantos "Ecce homo" no mundo! Meu Deus, quantos "Ecce homo"! Quantos prisioneiros na mesma condição de Jesus no pretório de Pilatos: sozinhos, algemados, torturados, à mercê de soldados ásperos e cheios de ódio, que se entregam a todo tipo de crueldade física e psicológica, divertindo-se em ver sofrer. "Não podemos dormir, não podemos deixá-los sós!".

A exclamação "Ecce homo!" não se aplica somente às vítimas, mas também aos carnífices. Ela quer dizer: eis aqui do que o homem é capaz! Com temor e tremor, digamos ainda: eis do que somos capazes nós, homens! Muito distante da marcha inexorável do Homo sapiens sapiens, o homem que, segundo alguns, nasceria da morte de Deus e tomaria o seu lugar

 Os cristãos não são, certamente, as únicas vítimas da violência homicida que há no mundo, mas não se pode ignorar que, em muitos países, eles são as vítimas marcadas e mais frequentes. Jesus disse um dia aos seus discípulos: "Chegará uma hora em que aqueles que vos matarem julgarão estar honrando a Deus" (Jo 16,2).  Talvez estas palavras nunca tenham achado na história um cumprimento tão pontual quanto hoje.

Um bispo do século III, Dionísio de Alexandria, nos deixou o testemunho de uma Páscoa celebrada pelos cristãos durante a feroz perseguição do imperador romano Décio: "Eles nos exilaram e, sozinhos entre todos, fomos perseguidos e lançados à morte. Mas, ainda assim, celebramos a Páscoa. Todo lugar em que se sofria tornou-se para nós um lugar de celebração da festa: fosse um acampamento, um deserto, um navio, uma pousada, uma prisão. Os mártires perfeitos celebraram a mais esplêndida das festas pascais ao serem admitidos no banquete celeste". Será assim para muitos cristãos também na Páscoa deste ano, (2015) 2016 depois de Cristo. Houve alguém que teve a coragem de denunciar, como leigo, a indiferença perturbadora das instituições mundiais e da opinião pública em face de tudo isto, lembrando a quais consequências essa indiferença já levou no passado.. Corremos todos o risco, tanto instituições quanto pessoas do mundo ocidental, de sermos Pilatos que lavam as mãos.

A nós, no entanto, não é permitido fazer qualquer denúncia neste dia. Trairíamos o mistério que estamos celebrando. Jesus morreu gritando: "Pai, perdoa-os, porque não sabem o que fazem" (Lc 23, 34). Esta oração não é simplesmente murmurada; é gritada para ser bem ouvida. Na verdade, não é sequer uma oração, mas uma exigência imperativa, feita com a autoridade de quem é Filho: "Pai, perdoa-os!". E como Ele mesmo disse que o Pai escuta todas as suas orações (Jo 11,42), devemos acreditar que Ele ouviu também esta última feita na cruz, e que, portanto, aqueles que crucificaram o Cristo foram perdoados por Deus (é claro que não sem antes se arrependerem de alguma forma) e estão com Ele no paraíso, testemunhando para toda a eternidade o ponto até o qual pode chegar o amor de Deus.

Essa ignorância, como tal, estava só nos soldados. Mas a oração de Jesus não se limita a eles. A grandeza divina do seu perdão consiste no fato de que o perdão também é oferecido aos seus inimigos mais ferozes. É para eles que Jesus alega a desculpa da ignorância. Mesmo que eles tenham agido com astúcia e malícia, eles realmente não sabiam o que faziam, não pensavam que estavam crucificando um homem que era de fato o Messias e Filho de Deus! Em vez de acusar os seus adversários, ou de  perdoá-los confiando ao Pai Celestial o cuidado de vingá-lo, Ele os defende.

Seu exemplo sugere aos discípulos uma generosidade infinita. Perdoar com a sua mesma grandeza de alma não pode envolver simplesmente uma atitude negativa, de renunciar a querer o mal para quem faz o mal; deve traduzir-se, em vez disso, em uma vontade positiva de lhes fazer o bem, mesmo que apenas com uma oração dirigida a Deus em seu favor. "Orai por aqueles que vos perseguem" (Mt 5,44). Esse perdão não deve procurar compensação nem sequer na esperança de um castigo divino. Deve ser inspirado por uma caridade que desculpa o próximo, mesmo sem fechar os olhos para a verdade, e que tenta parar os maus para que eles não façam mais mal aos outros nem a si mesmos.

Quereríamos dizer: "Senhor, o que nos pedes é impossível!", mas Ele nos responderia: "Eu sei. E morri para vos dar o que vos peço. Não vos dei apenas o mandato de perdoar, nem apenas um exemplo heroico de perdão; com a minha morte, eu vos dei a graça que vos torna capazes de perdoar. Eu não deixei ao mundo apenas um ensinamento sobre a misericórdia, como tantos outros também deixaram. Eu sou Deus e, para vós, fiz brotarem da minha morte rios de misericórdia. Deles podeis beber a mãos cheias no Ano Jubilar da Misericórdia que tendes pela frente".

Então, indagará alguém, seguir a Cristo é sempre um resignar-se passivamente à derrota e à morte? Pelo contrário! "Tende coragem", disse Ele aos apóstolos antes da Paixão: "Eu venci o mundo" (Jo 16,33). Cristo venceu o mundo vencendo o mal do mundo. A vitória definitiva do bem sobre o mal, que se manifestará no fim dos tempos, já aconteceu, de fato e de direito, na cruz de Cristo. "Esta é hora do juízo deste mundo" (Jo 12,31). Desde aquele dia, o mal é o perdedor: tanto mais perdedor quanto mais parece triunfar. O mundo já foi julgado e condenado em última instância, com sentença inapelável.

Jesus derrotou a violência sem opor a ela uma violência maior ainda, e sim sofrendo-a e revelando toda a sua injustiça e inutilidade. Ele inaugurou um novo tipo de vitória, que Santo Agostinho resumiu em três palavras: “Victor quia victima” – “vencedor porque vítima”. Foi ao "vê-lo morrer assim" que o centurião romano exclamou: "Verdadeiramente, este homem era Filho de Deus!" (Mc 15,39). Os outros se perguntavam o que significava o alto brado que Jesus tinha dado ao morrer (Mc 15,37). O centurião, que era experiente em lutas e lutadores, reconheceu de imediato que aquele era um grito de vitória. O problema da violência nos persegue, nos choca, inventando formas novas e espantosas de crueldade e de barbárie. Nós, cristãos, reagimos horrorizados à ideia de que se possa matar em nome de Deus. Alguém poderia objetar: mas a Bíblia também não está cheia de histórias de violência? Deus mesmo não é chamado de "Senhor dos Exércitos"? Não é atribuída a Ele a ordem de exterminar cidades inteiras? Não é Ele quem decreta, na Lei mosaica, numerosos casos de pena de morte?

Se tivessem dirigido a Jesus, durante a sua vida, esta mesma objeção, Ele certamente teria respondido o que respondeu sobre o divórcio: "Foi por causa da dureza do vosso coração que Moisés vos permitiu repudiar vossas mulheres, mas no princípio não foi assim" (Mt 19,8). Também sobre a violência, "no princípio não foi assim". O primeiro capítulo do Gênesis mostra um mundo onde a violência não é sequer pensável, nem dos seres humanos entre si, nem entre homens e animais. Nem sequer para vingar a morte de Abel, e assim punir um assassino, é lícito matar (cf. Gn 4, 15).

Nota: Esta foi a homilia proferida pelo capuchinho Frei Cantalamessa. Pregador da Casa Pontifícia, na Catedral de São Pedro, na Sexta Feira Santa de 2015.

 

Páscoa da Ressurreição C 16

O crucificado  ressuscitou!

Ele está vivo. O Domingo de Páscoa é o primeiro de todos os domingos e todo domingo é um dia de Páscoa. Há dois mil anos, cada domingo celebra este dia que fez o Senhor: um dia de alegria, Aleluia!

1ª leitura: “Nós bebemos e comemos com Jesus, depois que ressuscitou dos mortos” (Atos 10,34.37-43)

Salmo: Sl. 117(118) - R/ Este é o dia que o Senhor fez para nós: alegremo-nos e nele exultemos!

2ª leitura: “Esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo” (Colossenses 3,1-4)

Sequência: Cantai cristãos, afinal: “Salve, ó vítima pascal!”

Evangelho: “Segundo a Escritura, ele devia ressuscitar dos mortos” (João 20,1-9)

O inacreditável

O crucificado da antevéspera ressuscitou! A notícia ou, antes, o rumor espalhou-se por toda Jerusalém. Algo inacreditável! Ninguém viu Jesus levantar-se da morte. A Ressurreição, antes de tudo, foi um túmulo aberto e vazio. Primeiro, para Maria Madalena e as suas companheiras. E para os discípulos, em seguida. Muitos cristãos têm dificuldade em acreditar na Ressurreição. Mas não é preciso sentir-se culpado além da medida por causa disso: até mesmo os discípulos levaram algum tempo para admitir que Jesus estava vivo. "Tiraram o Senhor do túmulo e não sabemos onde o colocaram." A fé fica ainda mais difícil, porquanto a nova vida de Jesus é muito diferente da que ele tinha antes da sua morte. Ora, se Cristo não ressuscitou, toda a mensagem evangélica perde o sentido: "Se Cristo não ressuscitou, vazia é a nossa pregação, vazia também é a nossa fé…" (1 Coríntios 15,14). Se Deus não nos fez existir para sempre, não é verdadeiramente amor e estamos sob a dominação de forças obscuras. Não passamos de pequenos marionetes que, depois de dar umas três voltinhas por esta terra, partimos em definitivo... No entanto, a perspectiva de existirmos para sempre é precisamente o que dá valor a tudo o que a vida nos traz. O fato de Cristo ter suportado e ultrapassado todo o mal que podemos fazer, e que foi recapitulado em sua condução à morte, garante-nos o acesso a uma nova vida. Sem isto, diz Paulo que estaríamos sempre fechados em nosso pecado, neste pecado que tem sempre algo a ver com o homicídio exibido na Cruz. Com a Ressurreição, ficamos sabendo que, afrontado por este amor que o ultrapassa, o pecado não tem a última palavra.

Pedro e o discípulo preferido

O quarto evangelho não deu o nome deste discípulo. A tradição identificou-o a João. João foi o único discípulo que esteve ao pé da Cruz; foi o único declarado filho de Maria, de alguma forma em lugar de Jesus, que estava para morrer; e será o único a seguir Jesus e Pedro no final do capítulo 21. Por que o evangelista insiste na ordem de chegada destes dois discípulos ao túmulo, apressados em verificar o que dissera Maria Madalena? Este discípulo talvez encarne a proximidade amorosa que podemos manter com Jesus vivo. Proximidade esta que, mesmo fundada na fé, vai além da fé nas "verdades" sobre a natureza e sobre a obra de Jesus. Entretanto, apesar de ter sido o segundo a chegar, Pedro foi quem primeiro entrou no túmulo. Seria questão de prioridade? Afinal, sobre ele a Igreja virá a ser fundada. Notemos que nada foi dito sobre a sua fé na Ressurreição. Já do discípulo preferido, ao contrário, está escrito que "viu e acreditou". Mas o que ele viu? Um vazio, onde devia estar o cadáver: nada havia ali para se ver. Já estamos assim no "crer sem ver" do versículo 29 deste capítulo. E estamos todos aí: para nós, a fé só pode nascer de uma palavra que vem de outro, de alhures. O discípulo viu, no entanto, alguma coisa: o sudário dobrado e a toalha que havia recoberto a cabeça de Jesus. Estes detalhes significam sem dúvida que o corpo não foi removido na precipitação de um ato proibido e perigoso: houve tempo para colocar tudo em ordem. Melhor: foram deixados no lugar todos os apetrechos ligados à morte.

O corpo da ressurreição

Jesus não está mais lá. Daí em diante, não será mais localizável. Os evangelistas, no entanto, insistem no fato de que ressuscitou em seu corpo. Seria uma contradição? O Cristo ressuscitado escapa dai em diante das leis de espaço e tempo. Compreende-se assim a pergunta em 1 Coríntios 15,35: "Como os mortos ressuscitam? Com qual corpo voltam?" Paulo responde com a parábola da semente semeada na terra, já utilizada em João 12,24. Paulo põe o acento na diferença entre a semente e a planta que surge dela. É a misteriosa aptidão para mobilizar, utilizar e transformar o que se encontra no meio natural. A Ressurreição exacerba esta aptidão: "Semeia-se o corruptível, ressuscita o incorruptível; semeia-se a ignomínia, ressuscita a glória; semeia-se fraqueza, ressuscita a força; semeia-se um corpo psíquico, ressuscita um corpo espiritual". Um corpo psíquico, isto ainda podemos compreender, mas um "corpo espiritual"... É algo que nos ultrapassa, porque parece haver uma contradição nos termos. Digamos que o nosso corpo, lugar e instrumento de relação com a natureza e as outras pessoas, dilate até ao máximo esta função de relação. Chegaríamos então a estar em Deus ou como Deus. Por isso, se o corpo de Cristo ressuscitado guarda a sua singularidade, torna-se ao mesmo tempo comunhão de todos os homens. O novo corpo de Cristo ressuscitado assume o nome de Igreja. E será necessária a história toda, para dar-lhe nascimento. Estamos ainda longe do esperado, tanto na qualidade de nossa unidade quanto em sua universalidade.

Marcel Domergue, jesuíta (tradução livre de www.croire.com pelos irmãos Lara)


 

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